A C.B.B. (CONVENÇÃO BATISTA BRASILEIRA) DETÉM O LEGADO HISTÓRICO BATISTA?

A CBB detém o legado histórico batista?

A pergunta pode parecer improcedente e até improducente, após a primeira visada. Alguns alegariam que, sendo a CBB (Convenção Batista Brasileira) descendente histórica do movimento que se iniciou no século XVII, fruto do separatismo e puritanismo inglês, o DNA batista estaria garantido sem ter que apelar a famoso quadro de testagem do programa do Ratinho.

Ocorre que a tradição histórica por vezes se traduz em traição ao legado recebido. Não são poucos os grupos religiosos que, ao atingirem certo grau de institucionalização, terminam por perder sua identidade, ao negarem suas marcas, seus princípios que, no caso dos batistas, está imbricado no conceito e defesa da liberdade. Liberdade esta que se manifesta na autonomia do indivíduo, na autonomia da igreja e na autonomia institucional pela defesa da separação entre igreja/denominação e Estado.

Não por outra razão, o funcionamento administrativo de uma convenção batista sempre se dará de modo precário. Para os batistas, na sua origem, o trabalho associativo/convencional é um acidente, não um propósito. Lembre-se que não é a convenção que gera e gesta a igreja batista; esta nasce a partir de outra igreja batista. A convenção, quando vem, acontece depois. Se deveria ter vindo ou não, esta é outra conversa.

A precariedade se dá justamente pelas “amarras da liberdade”, a tríplice autonomia (indivíduo, igreja e do Estado) que a convenção deveria defender. Tal precariedade administrativa se mostra na impossibilidade de intervenção direta em uma igreja, no respeito que a convenção deve ter pela autonomia da igreja, e na difícil sujeição da denominação às contribuições das igrejas, que torna o orçamento da instituição um exercício de fé.

Note bem: não estou justificando a má administração. Nossa história batista brasileira é pródiga em casos de péssima gestão. Todavia, me parece uma excrescência Batista que uma convenção, seja ela qual for, se torne muito forte. Nosso anticatolicismo batista deveria fazer soar os sinais de alerta e de estranheza toda vez que uma convenção, ou que um executivo, tivesse poder demais. Mesmo porque, Cúria e Papa só na Igreja Católica Apostólica Romana.

Assim sendo, o princípio convencional, na sua relação com as igrejas batistas, deveria transitar de modo análogo ao sentimento de João Batista em relação a Jesus. É necessário que as igrejas cresçam e que a convenção diminua. Menos ingerência; mais serviço às igrejas.

Ao que me parece, a atual CBB destoa e dista do legítimo legado batista. Ao abraçar o fundamentalismo, procura formatar e uniformizar as igrejas. Parte da liderança atual parece entender que é pela Declaração Doutrinária (DD) que se localiza os princípios históricos. Nada mais equivocado e perigoso! E isto por duas razões: os batistas não possuem credo, o que torna a DD indicativa e não normativa; e também porque a DD é posterior aos princípios, os quais se constituem em lentes para ler o mundo e até sintetizar os pontos básicos da fé em um corpo doutrinário.

Mas quais princípios (você deve estar se perguntando)?

Os que estão ligados à liberdade como exposto há pouco. Quando uma convenção tem arroubos para intervir em igrejas que, na sua autonomia (pedra angular da eclesiologia batista), resolvem não se enquadrar ao molde proposto (ou seria imposto?); quando uma convenção não aceita escolhas políticas que não sejam as dela (ainda que nunca tenha tido uma decisão em assembleia sobre o assunto); quando a liderança de uma convenção passa a frequentar os espaços de poder visando apoiar certo mandatário/candidato; quando ela usa de seus espaços institucionais para promover uma linha ideológica; quando suas notas possuem uma só direção; então estamos falando de uma instituição que perdeu seu DNA, seu lastro, ao longo da história e de seu processo de institucionalização.

O que estou tentando dizer é que o logo da CBB, que já foi sinal de chancela do legado batista, hoje não mais é. Este incidente histórico traz uma reparação histórica sobre o acidente que é o trabalho convencional. O legado, outrora tacitamente transposto para a Convenção, retorna para a Igreja local. Sim, é nas igrejas batistas (especialmente nas que não se curvaram ao fundamentalismo), e não mais na CBB, que ainda é possível encontrar o DNA batista. Seus princípios históricos sempre estiveram associados à liberdade, seja no campo individual (liberdade de consciência e de expressão), seja no campo eclesial (liberdade espelhada na autonomia da igreja local), seja no campo institucional (pela defesa da separação entre Igreja e Estado).

É pelas lentes da liberdade que os batistas vêm o mundo. Ou, pelo menos, deveriam ver.

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